1. Introdução
Os céticos dirão que a passagem de um ano para o outro
é apenas uma mudança de calendário. Os
românticos, que se trata de uma mudança de ciclo de vida. Os otimistas, que
melhores dias virão. Os pessimistas, que são mais doze meses de tristezas e
decadência humana. Os apocalípticos, que
é mais um passo para um triste final de nossa civilização.
Nenhuma dessas visões, se tomadas como uma parcela em um
conjunto de situações, deixa de ser uma parte da verdade, ou uma verdade
possível dentro de um contexto maior. Mas, se alguma delas é tomada como única visão do futuro, falseia um princípio geral,
que não pertence apenas à Ciência, posto que dito por um gênio da Física :
“Tudo é relativo”. Sim. Vejamos um exemplo.
Se optarmos por
pinçar da Bíblia duas visões de dois homens sábios e iluminados, entenderemos
que existe uma fatalidade intransponível
e um convite à imprevisão, mas, se compararmos em que contexto foram ditas,
veremos que nos falam de uma parcela da verdade inteira colocada no texto onde
estão inseridas:
Salomão: O
que tem sido, isso é o que há de ser; e o que se tem feito, isso se tornará a
fazer; nada há que seja novo debaixo do sol. (Eclesiastes. 1,9)
Jesus: Não vos inquieteis, pois,
pelo dia de amanhã; porque o dia de amanhã cuidará de si mesmo. Basta a cada
dia o seu mal. (Mateus. 6.34)
Se nos dedicarmos a ler
o texto todo, logo veremos que um não quis dizer que existe a fatalidade
intransponível e o outro não aconselhou ninguém a não fazer nada, mas, sim ,
que o futuro poderá ser a repetição do
que foi realizado se nada for feito para modificá-lo ; e que, no outro caso, o
referido é no sentido de que se deve cuidar bem do presente, pois o futuro poderá nos trazer
novas surpresas e para tanto devemos agir conforme as circunstâncias que temos
à mão no presente, para podermos prover o futuro.
Assim, também, a
mudança de um ano é, ao mesmo tempo, a passagem de um calendário para outro, e
nisso não há nada de novo, como também é uma época em que as pessoas recomeçam
suas atividades, traçam planos de vida,
e, de acordo com o que fizerem, poderão repetir todos os acertos ou
erros passados, ou acrescentar-lhes algumas coisas as quais poderão ser ou não
causa de alegrias e tristezas, a mais ou a menos; como, também, se prosseguir e
aumentar a falta de valoração moral e ética de nossa sociedade, poderá esta ser
mergulhada, a passos largos, em uma
autodestruição.
O ser humano, desde o seu início, vem evoluindo passo a
passo e o faz de acordo com a organização que imprime à sociedade em que
vive. E, para tanto, há necessidade de
se estabelecerem metas iniciais e finais para cada etapa de desenvolvimento. O
calendário, desde os tempos conhecidos por nós, foi uma invenção que facilitou
conseguir-se cumprir as metas estabelecidas e desejadas, bem como a corrigir os
eventos indesejados ou inesperados. E, para tanto, precisamos medir o tempo, a
que todos estamos presos em nossa realidade tridimensional, sejamos do reino
animal, vegetal ou outro. Para nós, o calendário mede e estabelece o início e o fim de cada etapa a
ser cumprida. Seja ele demonstração de poder, como o de antigos romanos, ou de origem religiosa, como o gregoriano,
que é utilizado no mundo cristão, solar (de acordo com a rotação da Terra em
torno do Sol – 12 meses ), ou lunar (de acordo com as fases da Lua, como o islâmico (com 12 meses mas com
menos 11 dias do que o nosso), ou lunissolar, como o hebraico (alternadamente
pelas fases da Lua e rotação da Terra , por isso um ano de 12 meses seguido por outro de 13).
Ou, ainda, como os antigos maias, a existência de dois calendários, um de conta
longa, baseado em fatos astronômicos para
eventos existenciais relacionados ao Cosmos, e outro para efeitos de agricultura e fatos da
natureza, como estações do ano. Todos,
de qualquer forma, necessários à organização da vida da sociedade em períodos
previsíveis para cumprimento das metas desejadas.
Vivemos sob a orientação
do calendário solar gregoriano. Em decorrência da sua institucionalização no
Ocidente, hoje se inicia para nós um novo período em que todos os ocidentais modernos fazemos planos, quer financeiros, quer de
estudos sobre os conhecimentos humanos que desejamos obter, quer sobre metas existenciais materiais e
imateriais e atividades a que desejamos dar continuidade ou não, ou ainda,
sobre modificações a serem levadas a efeito em todas as atividades em curso.
Não, evidentemente, pensando que seja o único dia para tanto, ou porque seja
mágico ou porque foi estabelecido
somente podermos levar a efeito essa atividade neste dia. Tudo podemos
iniciar, rever, corrigir e concluir a
cada dia de nossa existência.
Há uma convenção geral, notadamente para regular os fatos
econômicos mundiais e locais, de
mudanças na contagem de um novo ciclo de finanças — por isso também se pode chamar, em sede de trabalhos,
cada ano, de “exercício financeiro” ou apenas “exercício de...”. E, como em
nosso mundo de hoje, baseado principalmente nas trocas econômicas, muito da
vida de cada pessoa depende do fator econômico, costuma-se traçar planos
individuais e coletivos, oficialmente, a partir do dia 1º. de janeiro. E, via de
consequência, meditar-se sobre os
resultados do ano anterior costuma ser um bom hábito, a estender-se sobre todo e qualquer assunto a
partir de então, como um marco inicial de uma nova etapa a ser empreendida –
uma forma de coordenar e organizar a nossa vida, em todas as áreas.
Nestas meditações que ora exponho,
não serão incluídas as minhas aspirações pessoais. Elas existem, mas não são
mais tantas quantas as de quando era
jovem. Na juventude muito há de se conquistar para a realização pessoal e, para
tanto, necessita-se mais de lutar e estabelecer metas pessoais a serem
conseguidas, geralmente de ano a ano. Ou, mais espaçadamente, as mais demoradas,
mas nem por isso menos importantes para
a realização da pessoa. Conquistadas as metas da juventude, outras surgem, o
ser humano busca sempre novas metas para
assim realizar o seu tempo e sua finalidade
na sua atual existência.
Essas modificações no mundo são decorrentes de influências que estão
atingindo institutos político-sociais existentes em todas as regiões, que se
entrelaçam em seus princípios e finalidades
e se influenciam mutuamente, cujo
conceito atual está passando por uma reformulação de princípios.
Princípios novos hão de surgir, embora ainda não tenhamos a consciência de
quais sejam, e vários estudiosos já se debruçam sobre a sua provável natureza.
Esses institutos assim tão
importantes são, notadamente, os conceituados como Nação, Estado-Nação, Liderança e Democracia. Entendo que esses conceitos se entrelaçam e, examinando-se um,
forçosamente encontramos o seu relacionamento com os demais. Sendo assim, a
crise em um desses institutos influi nos demais e deles sofre a influência,
atingindo severamente os alicerces sobre
os quais cada um foi erigido. Em nossos dias estabeleceu-se uma
crise de todos, que merece ser examinada
em face da globalização das relações comerciais e políticas e da revolução das
comunicações, via Internet – porque esses elementos novos alargaram a visão dos limites estabelecidos pela Soberania,
pela Língua, pela Religião e pela Cultura, assim como outro alargamento de visão os fez surgir e
ressurgir, desde a antiguidade clássica e durante o Renascimento europeu – e é
essa visão que hoje requer um reordenamento.
3. Ligeira Análise da
evolução sócio-política do Ocidente e do Oriente
Aqui será feita uma
rápida menção a estudos expostos por Max Weber em seu célebre livro “A ética protestante e o 'espírito' do capitalismo” e nos “Ensaios Reunidos
de Sociologia da Religião”, sem que se pretenda fazer uma análise sobre
o assunto. O tema é abordado apenas para nos colocarmos razoavelmente dentro
dos acontecimentos atuais da procura dos
países orientais pela instalação da Democracia, com movimentos que inicialmente
se denominaram “primavera árabe”, um processo que se demonstra muito difícil e
sofrido, estando a merecer várias intervenções internacionais para uma solução
menos traumática do que já existe e que é muito intensa, notadamente na Síria,
conforme público e notório – mas não ficam atrás também os problemas do
Iraque e em outras áreas cujo território
estatal é constituído artificialmente,
sem o respeito às fronteiras das antigas
nações orientais, como a Pérsia, por exemplo.
De qualquer sorte, se olharmos pelo ângulo do desenvolvimento
econômico, as democracias autoritárias têm obtido um enorme sucesso,
enquanto as democracias tradicionais, fundadas nas liberdades individuais, estão
a merecer algumas reformas institucionais, a fim de facilitarem a
governabilidade, quando se trata da forma presidencialista, em que muito poder
se concentra em mãos do Presidente: a) ora
em detrimento da representatividade popular, normalmente pelo Parlamento,
que passa a uma fase de "arranjos" políticos para constituírem uma
maioria, por vezes relutante, quando o pluripartidarismo se inclina a um
excesso de partidos, geralmente sem metas bem definidas; b) ora concentrando
poderes em contraposição constante com o do Presidente, em um verdadeiro
"cabo de guerra", sempre que a quantidade de partidos, embora com
metas bem definidas, reduzem-se ao mínimo de um par.
Com a Internet e o fenômeno da difusão do conhecimento
e da liberdade de expressão, a forma de vida ocidental tem penetrado na visão individual e coletiva dos cidadãos
orientais, notadamente aqueles que têm ou tiveram no passado maior contato
com países ocidentais (mais
especificamente através do colonialismo). Essa proximidade lhes apresenta, em Estados relativamente afins (pelo tempo em que permaneceram unidos, com a hegemonia ocidental) a imagem das facilidades e melhores
condições de vida para as pessoas que
não fazem parte da elite dominante, decorrentes da forma democrática de decisões governamentais. E, dessa forma, se incentivam a levar a efeito mudanças.
Vejamos no Quadro abaixo, com
base nos ensinamentos de Weber, as principais semelhanças e diferenças
que deram a origem e evolução de
pensamento filosófico, em parte semelhantes, mas evidentemente diversos do Ocidente e do Oriente atuais –
que fizeram atingir, no mesmo espaço de
tempo, uma versão diversa de forma de
organização sócio/econômica atual:
OCIDENTE/ORIENTE
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Semelhanças
1)
Quanto à origem : Tanto o Oriente Moderno quanto o Ocidente Moderno são sociedades procedentes de antigas
sociedades (orientais os primeiros e ocidentais os segundos), onde
predominaram normas religiosas como
reguladoras das normas de conduta político-econômico-sociais. As influências
sofridas por parte da Europa sob domínio oriental na Idade Média, por longo
período, não chegaram, contudo, a impor uma filosofia à outra, antes houve
uma integração, guardando-se as
características locais, incrustadas definitivamente pela grande influência da civilização imposta
pelo Império Romano.
2) Quanto à formação religiosa : No Oriente Islâmico, foi a religião criada
por Maomé que logrou a união dos vários povos (nômades ou não, mas
enquistados em regiões com suas próprias leis), que vieram a formar Estados evoluídos
econômica e culturalmente, na Antiguidade; no Ocidente, foi o Cristianismo
que logrou se impor no território Europeu, o ponto comum influente na união
das diversas cidades independentes em Estados-Nacionais da atualidade
: como exemplo, temos o caso da Itália, que era, na Idade Média, dividida em
cidades onde reinavam monarcas
absolutos, os seus “Príncipes”.
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Diferenças
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Países Ocidentais
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Países Orientais
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1) As
fronteiras dos Estados foram estabelecidas de forma soberana, tanto nos
Europeus quanto nas suas colônias que se libertaram quando já haviam atingido um “status” de
Nações, na acepção moderna.
2) A
religião de onde procede a atual filosofia cultural dos Estados, o
Cristianismo, é procedente do
Judaísmo Antigo, de cuja fonte herdou
o racionalismo prático.
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1) As fronteiras dos Estados foram, na maioria
daqueles onde atualmente ocorre a chamada “Primavera Árabe”, estabelecidas
artificialmente, a partir do final da
Segunda Guerra Mundial, sem respeito às fronteiras dos antigos Estados-Nação
e Impérios Orientais, não possuindo um “status” de Nações, na acepção moderna
.
2) Os
Estados, organizados a partir de fronteiras tradicionais ou impostas , sofreram uma unidade religiosa,
cuja origem é oriental. Mas a religião
de onde procedem é o Islamismo, fonte do
misticismo religioso atual. Salvo em Nações como o Japão, a China e a
Índia, cujas origens religiosas foram
outras, que não tiveram, contudo, por diversos motivos, força
suficiente para impor-se como fonte de
autoridade estatal.
3) Os Estados são religiosos:
são regidos pelas leis escritas nos livros sagrados. E, tendo-se o Islamismo
dividido em várias vertentes, as populações que as seguem geralmente não conseguem uma
convivência pacífica, pois as normas
religiosas divergem , embora com a mesma base central, o que as
faz se assemelharem a nações diversas
contidas em um mesmo território.
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4- Das Cidades ao
Estado-Nação
Alguns historiadores, até meados do
século passado, costumavam chamar a
Idade Média, no Ocidente, de “Idade das
Trevas”, por entenderem que, devido ao imperialismo da Igreja Católica, que
restringiu a capacidade de adquirir conhecimentos pelo ser humano aos limites
do que permitia ou não, ficou impedida a evolução científica àquela época. Essa
conclusão foi tirada sendo feita uma
visão macro de acontecimentos. Mas, na realidade, como ficou constatado
posteriormente, em uma visão micro, houve, sim, durante aquela época, muito
estudo e muitas descobertas.
Se tomarmos em conta a primeira hipótese,
da inexistência de evolução na Idade Média, podemos considerar, sim, o
Renascimento da Idade Moderna como um
verdadeiro milagre, o qual foi, à época, chamado de “Iluminismo”. Mas se
levarmos em consideração o muito que foi
estudado e descoberto em ambientes
fechados e altamente científicos, como
castelos, mosteiros e organizações juvenis nas universidades, notadamente de
Paris, observamos que houve, isto sim, um crescimento silencioso que veio à luz
no Renascimento. Nada se opera do dia para a noite, nesse terreno. O que parece
milagre, no que tange ao conhecimento humano, é obra de muito esforço e muito sacrifício anterior de indivíduos e
grupos de indivíduos que somente vem a público
nas ocasiões oportunas – e esse conhecimento, assim distribuído
massivamente, vai elevar os demais.
Exemplos públicos desse fato foram Giordano Bruno , Galileu Galilei ,
Isaac Newton e Leonardo da Vinci, além de muitos outros, também conhecidos ou
que se tornaram anônimos ao longo dos tempos, mas que deixaram suas
contribuições através dos seus inúmeros discípulos e seguidores. Também em nossos dias, em que se opera uma época de muitas modificações, sem ainda parâmetros determinados, também existem muitas pessoas e grupos de pessoas fazendo estudos sobre os acontecimentos passados e suas projeções para uma futura organização social mais condizente com a evolução científica já operada. Devemos estar alertas para as novas filosofias que em breve deverão aparecer.
Até mesmo a Igreja Católica Romana, que contém em si uma organização estatal (embora o Papa reine como monarca absolutista, não havendo democracia, e não exista uma noção de Estado-Nação), já está se modificando , em função dos novos tempos que já sente estarem se instalando definitivamente, adotando alguns preceitos inicialmente reservados apenas aos Estados Laicos, tais como a aceitação do cidadão homossexual como componente do seu corpo de fiéis em todo o mundo. Essa aceitação, que se iniciou no Ocidente com o entendimento laico de que todos os cidadãos devem ser iguais perante as leis, estendeu-se, portanto, para um entendimento teológico da sobreposição da condição humana sobre suas eventuais variações, perante Deus, que acolhe a todos em igualdade perante sua Justiça , assim como a justiça humana recebe como um direito natural a igualdade do ser humano, independente de diferenças de gênero, pensamento, etnia ou religião. Esse é um grande passo para um melhor entendimento entre as pessoas, já que, como colocado acima, com base nos ensinamentos de Max Weber, a religião, no Ocidente, como no Oriente, foi parceira importante para a busca da evolução humano-social.
O Estado, politicamente considerado, em si, não é obra antiga nem decorreu de uma criação intelectual, mas de uma evolução natural da sociedade humana, acompanhando o crescimento populacional e as relações de comércio entre os povos. Provém notadamente dos séculos XVI e XVII, tendo evoluído das cidades , até quando, já em fins do XVIII e XIX, chegou ao “status” atual de Estado-Nação, considerado como uma evolução positiva da igualdade entre as pessoas. Tem-se as origens das organizações das sociedades mais ou menos de acordo com o seguinte esquema:
Os nossos
atuais Estados não são decorrentes da
transformação dos antigos Impérios, como o Romano, o Persa, o Egípcio , eis que todos eles se fracionaram, depois de
um certo momento histórico, em razão de várias ocorrências existenciais das
populações integrantes e razões externas, voltando a ter uma divisão
territorial, em cidades-estados e cidades, as quais, unindo-se, vieram a formar, por laços de parentesco, conquistas locais ou interesses comerciais dos governantes, os Estados
da Idade Média (séculos XVI e XVII), motivo pelo qual se diz ser essa organização por “Razões
de Estado” . No Ocidente, quase todos provêm do fracionamento do Império
Romano, que teve uma característica intrínseca: formou-se da submissão de
vários povos e anexação de seus territórios, a maior parte diversificados em função da língua, da
religião, dos costumes, grau de desenvolvimento socioeconômico e aspirações - guardaram suas etnias enquanto sob tal domínio, desde que não ameaçassem o Império, podendo praticar suas religiões, desde que incluíssem também as divindades romanas. Enfraquecido por problemas
políticos internos e da incapacidade de administrar tão grande território com
tão grande diversidade, aliadas a esse
fato as invasões estrangeiras (de povos conhecidos por eles como
“bárbaros”), aceitos pelos povos não
satisfeitos com a dominação, desintegrou-se, incialmente em dois impérios
(Império Romano do Ocidente e Império Romano do Oriente) e estes,
posteriormente, em várias cidades mais importantes às quais se agregavam outras
menores, sem contudo, uma constituição
política a governá-las – eram cidades-estados que protegiam aquelas em seu entorno. A noção do Estado-Nação veio mais tarde, com o
Iluminismo, com a aquisição da ideia de nacionalidade, do fim do século XVIII e do XIX,
formando-se, então, os modernos “Estados da Razão” , que são os Estados-Nacionais de hoje.
A noção de nacionalidade veio ainda na Idade Média, a partir da congregação de estudantes procedentes de várias partes do mundo, nas Universidades, notadamente em Paris. Aqueles que possuíam a mesma língua, procediam das mesmas regiões e praticavam os mesmos costumes, passaram a reunir-se em congregações, por uma facilidade de relacionamento. Daí para passar-se a uma ideia de regionalismo, pela semelhança de etnia, língua e costumes, independente de territorialidade, foi um passo : as comunidades estudantis levaram para seus locais de origem esses conceitos e o fato foi-se agregando às populações, até porque os universitários eram, na maioria, pessoas provenientes das classes mais abastadas e com influência política em suas cidades. (*)
Assim como as Cidades foram protagonistas no passado, influenciando na modificação da organização mundial, como centros irradiantes de cultura e evolução científica, após a queda dos grandes Impérios, os Estados-Nações são, nos dias de hoje, os protagonistas da nova sociedade que se instalou a partir da revolução industrial e da economia de mercado, com o estabelecimento de fronteiras baseadas na soberania. Contudo, algumas modificações já se sentem nesse panorama : aparecem as grandes confederações, que são uniões de Estado com finalidades comerciais e de evolução regional, como, por exemplo, o Mercado Comum Europeu, que evoluiu para a União Europeia, pelo Tratado de Maastricht, em 1993. De futuro prevê-se que o conceito atual de Nação, a informar a soberania territorial de cada Estado, também deixará de ser fator proeminente, para atender a interesses mais diversificados , desde que comuns, para um governo mais igualitário que proporcione melhores condições de vida às populações em geral : é decorrente da globalização das relações mundiais, a par do grande desenvolvimento das comunicações, via Internet, principalmente, que está derrubando fronteiras estabelecidas por convenções e tratados internacionais. Não se pode dizer que foi esse o ideal da Organização das Nações Unidas, isto é, o de se formar um Continente e depois um Mundo sem Fronteiras, mas é de se afirmar que a ideia da congregação dos vários Estados Soberanos para decidirem sobre a Paz Mundial foi a sua precursora.
Em
Esparta, no ano de 480 a.C. tínhamos uma Europa
dividida em cidades, vilas e a
Grécia, dividida em cidades-estados, nas
quais, a partir de Atenas, dominava o regime de governo democrático (a
Democracia Direta). E assim ocorria em Esparta.
Não podemos dizer que o Rei Leônidas
e os seus guerreiros espartanos, ao defenderem a liberdade e a sua cidade contra
o domínio dos persas, estariam firmando um conceito de nação – esse conceito é
moderno, mais em sentido cultural. Tampouco as populações que se juntaram a ele, no decorrer da sua
caminhada até o desfiladeiro das Termópilas, o fizeram movidos pelo sentimento
de defesa de seu grupo étnico, com os
mesmos costumes e o mesmo idioma (componentes do moderno conceito de Nação),
mas tão só, como o monarca e seus guerreiros, para livrar suas cidades, que permaneceram
separadas após a guerra do Peloponeso, da escravidão e da morte. Eis que, para
que haja uma Nação a unir os povos, é necessário, acima de tudo, que haja uma “consciência nacional” , o que de fato
não existia àquela época.
No passado, os Impérios substituíam-se
uns aos outros, os mais bem equipados belicamente sobre os outros, mais antigos
ou contemporâneos, e essa
miscigenação entre as diversas
culturas vinha a formar outros grupos populacionais. Por isso não podemos
classificar nem a Grécia Antiga nem o
Império Romano como duas grandes nações
: o primeiro, como já foi apontado, porque era dividido em Cidades-Estados e, o
segundo, porque composto por povos de várias etnias, línguas e costumes, que
não formavam uma unidade nacional, nem chegaram a manter laços de
união entre si, eis que não
estavam unidos, mas atados sob o poderio
militar do Poder Central. Em seus últimos anos, em Roma, havia uma variedade
enorme de indivíduos de várias etnias,
algumas delas consideradas bárbaras, mas que passaram a adotar os costumes romanos para usufruir das benesses da capital imperial e, não, por entenderem
fazer parte de um grupo homogêneo de pessoas conscientemente unidas por um fim
comum de constituir uma grande Nação.
Estava, assim, instalada a ideia de
Nação no Ocidente, com uma conotação de conscientização dos seus componentes.
Daí, então, as Nações foram-se organizando: mesmo os Impérios que se formaram
com as Grandes Descobertas da Navegação vieram com a intenção não apenas de
unir os territórios, mas de levar até eles os principais marcos distintivos das
suas respectivas nacionalidades. Tal é o caso da América Latina e do México (portugueses
e espanhóis), do Canadá e dos Estados Unidos da América, Austrália e Nova
Zelândia (franceses e ingleses), que criaram sua própria nacionalidade, com as
características locais que deram novas cores às antigas de além-mar e em menos
de 500 anos desde sua descoberta passaram a formar, elas mesmas, novas nações.
Ainda na Espanha temos os Bascos, reivindicando a sua independência, os Irlandeses,
desejando sair do Reino Unido, também em razão de seus laços nacionais que se
distinguem daqueles a que estão adidos.
A experiência do Oriente é diversa: há várias etnias regionais. O Antigo Império Egípcio logrou legar aos povos conquistados, bem menos evoluídos do que ele, características de seus costumes e desenvolveu-se em um território contíguo e contínuo a ele, onde havia semelhanças mais do que diferenças – e, mesmo conquistado , primeiro pelo Império Grego de Alexandre e, depois, pelo Império Romano de Augusto, possuiu a magia de trazer os conquistadores para sua área cultural de influência. E povos se formaram fora do seu território, por vezes mais antigos do que ele, mas que não despertaram, como aos Impérios Ocidentais antigos, a cobiça de estender mais o seu território além do que entendiam ser necessário. Ao continente Africano se estendeu também o Império da Idade Moderna de Portugal, Espanha, França, Holanda, cujas Nações foram libertas apenas há pouco mais de 60 anos , quando a Organização das Nações Unidas fez a exigência da sua independência. Vários povos nômades foram unidos pela religião islâmica, passando usos e costumes a serem ditados por uma lei única, de fundo místico, inscrita no Alcorão. E, após a Segunda Guerra Mundial, por decisão das Nações vencedoras, foram estabelecidas fronteiras artificiais que desatenderam a localização das etnias diferentes e se formaram Estados com diversas nações : o Iraque, o Irã, por exemplo. Outro caso importante foi o caso judaico, cujo território, formador do moderno Israel, também foi delimitado em gabinetes da ONU, a partir de territórios designados pela Inglaterra, que, à época do final daquele grande conflito, dominava a região e a doou para a formação do novo Estado.
A China e o Japão são exemplos
diversos, tanto do Oriente quanto do Oriente. Ambos foram formados da união de
diversos reinos, que depois se uniram por força das armas, com etnias diversas
mas com origens comuns, para formarem
Impérios. E dentro desses Impérios já se formaram Nações, pois a língua, os
costumes, religiões, grandes correntes filosóficas que influenciavam os nobres
e os demais cidadãos, e a própria moeda, foram razões para uma unidade nacional.
Mesmo os territórios menores, onde havia
Estados independentes, como a Ilha de
Formosa, o Tibet, Taiwan, que foram anexadas à China em fins do século passado
e princípio deste, guardam com a China Continental muitas semelhanças,
principalmente a etnia e a língua.
Não será pela forma de governo que se estabelecerá a
utilidade e a funcionalidade de um Estado Nacional. É bem verdade que a
Democracia hoje impera na maior parte desses Estados. E o último grande
império, o da União Soviética, também veio a dividir-se nos antigos Estados
Nacionais que a formavam, em uma experiência malograda de imposição do sistema
econômico-social do comunismo. Todas essas nações assim separadas são ou estão
tendendo para a experiência democrática, mesmo a moderna Rússia. E todos
aqueles que aspiram a unidade de suas populações, mesmo nos Estados do Oriente
onde ainda vigem as monarquias hereditárias,
o povo, unido pela sua consciência nacional, vem procurando uma forma mais igualitária de divisão de
poder.
Não,
pois, que as situações sejam idênticas ou iguais, mas as etapas se repetem de acordo
com uma normatividade comum, à semelhança do que ocorre na equação acima. E nesse
ponto também os antigos Maias bem esclareceram em seu calendário de conta longa, sobre os ciclos ou “baktuns” ( anteriormente
calculados em 13, mas agora, depois da descoberta de novos documentos, tem-se
que sejam 17). Em nosso tempo, o célebre criador da “psicologia analítica”,
Carl Jung, também chegou à conclusão, pelo
método científico, da existência de “Aions” (**), em que sobressaem determinadas
influências, psíquicas e sociais, que
determinam a forma como acontecem as
coisas em nosso mundo, aí entrando o conceito de arquétipo e inconsciente
coletivo.
1º. Exemplo:
“Vidas Paralelas”, livro escrito por Plutarco, que viveu entre 45 e 120 d.C., onde faz a análise de vidas de grandes homens de sua época (antiguidade clássica) , distantes em tempo e espaço, sem nada que os fizesse conhecer qualquer atividade de um ou de outro, mas que agiam e pensavam de maneiras análogas, quando não iguais - por isso classificou essas vidas como paralelas. Eles modificaram a sociedade em que viviam e diversas umas das outras, de uma forma uniforme, levando-as a guardar um paralelismo de filosofia e de vida, proporcionais ao paralelismo que esses indivíduos assim predestinados guardavam entre si, e que desaguou em uma nova sociedade, a partir do início da Idade Média : de igualdade e de finalidade. Nessa obra ele
demonstra haver entendido uma certa fatalidade do destino ao reunir, em locais
tão diversos, personagens com características parecidas para influenciar a
sociedade em que viviam para um determinado direcionamento evolucionário.
“... Todas estas, meus
amigos, são opiniões que os jovens
absorvem dos sábios, tanto escritores de prosa quanto poetas, que sustentam que
o justo por excelência é aquele que impõe a força vitoriosa. E disso resulta
que os jovens estão tomados por uma epidemia de impiedade, convencidos de que
os deuses não são em absoluto deuses como os que as leis nos orientam a concebê-los;
e , em consequência disso, surgem também facções quando esses mestres os atraem
rumo à vida que é correta de acordo com a natureza, o que consiste em ser senhor
sobre os outros em termos reais, em lugar de ser seus servos de acordo com a
convenção legal...”
Acaso
não estarão os nossos jovens de hoje atuando de “forma violenta”, como na época
de Platão se dizia “epidemia de impiedade”, justamente porque os valores morais
de nossa sociedade são duramente contestados por escritores enaltecidos pela mídia,
que os combatem, mas não apresentam novas regras, à semelhança do que sucedia
àquela época? E não se tratava, então, da época que precedeu a mudança de uma
forma de vida de até então e se tornou depois a moderna sociedade Ocidental? Não
estaremos então, também, nessa fase de transição? Não estarão, por acaso, também, em mosteiros,
em universidades, em grupos de
humanistas que se reúnem sem estarem
sob os holofotes da mídia, em convites a
internautas pela Internet, realizando as necessárias atitudes para a
mudança de “Aion”?
“O pensamento da realeza, diverso daquele do povo , que já assimilara as novas doutrinas e as tinha insculpidas no seu ser, aguardando a ocasião propícia de mostrar à luz a sua força. E tal se deu ainda na primeira infância de Locke : ergueu-se da multidão que assistia ao injusto martírio do panfletário William Prynne (1637), no momento em que o carrasco executava a sentença, um retumbante grito de terror cuja repercussão provocou a queda de Carlos I – estava expressa, no seu conteúdo, não a insatisfação, mas a cólera e o repúdio ao poder absoluto e arbitrário personificado naquele monarca.
William Prynne era um panfletário puritano que publicara um panfleto (crítico) ao teatro, quando a rainha e damas da corte ensaiavam uma peça, por isso foi condenado e teve executada uma sentença de perda das orelhas.
Em 1637 William distribuiu outro panfleto, tecendo críticas a um membro do governo. Desta feita, a multidão, reunida na Praça dos Martírios, se rebelou: A sentença era de ter as bochechas marcadas com ferro em brasa com as letras S.L. (Seditions Libeller, ou Libelo Sedição) e ter cortado o que lhe restara das orelhas. Quando o carrasco iniciou a execução, ouviu-se um brado de revolta de todos os presentes, frente a semelhante terror. E esse brado ecoou em toda a Inglaterra, até mesmo dentro do Palácio Real e deu-se a queda do monarca. Iniciava-se assim uma nova era, em que os direitos do cidadão começaram a ser reconhecidos, graças à reação da coletividade.”
Não teria sido, por acaso, se é que o acaso realmente existe, que as manifestações a partir de junho do ano passado, no Brasil, a “Primavera Árabe”, de dois anos para cá , se assemelhem, em sentido genérico, a novos gritos contra o “Libelo de Sedição” moderno? Será que os governantes, além de ouvirem (pois todos os que não são surdos ouvem), terão o necessário discernimento para responder acertadamente a esses reclamos das sociedades sob sua administração? Esperemos que sim, eis que a História nos ensina a fatalidade dos fins evolucionários das sociedades – a forma de execução das transições e o resultado é que se modificam (essas são as incógnitas), mas, não, as regras de realização, tal como apresentado na equação matemática acima.
Volta-se
ao final, ainda, ao item 1 acima (Introdução),
à citação das palavras constantes do Evangelho de Mateus, sobre
enigmáticas palavras, para
interpretarmos que o dia de amanhã será , certamente, decorrência
do que se faz hoje, mas, fatalmente, ele ocorrerá e, por isso, deve-se cuidar
do presente, dia-a-dia : “porque o dia de
amanhã cuidará de si mesmo”.
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(*) Nação, do latim natio, de natus (nascido), é a reunião de pessoas, geralmente do mesmo grupo étnico, falando o mesmo idioma e tendo os mesmos costumes. Foi, no Ocidente, , formando assim, um povo, cujos elementos componentes trazem consigo as mesmas características étnicas e se mantêm unidos pelos hábitos, tradições, religião, língua e consciência nacional.
Mas, a rigor, os elementos território, língua, religião, costumes e tradição, por si sós, não constituem o caráter da nação. São requisitos secundários, que se integram na sua formação. O elemento dominante, que se mostra condição subjetiva para a evidência de uma nação assenta no vínculo que une estes indivíduos, determinando entre eles a convicção de um querer viver coletivo. É, assim, a consciência de sua nacionalidade, em virtude da qual se sentem constituindo um organismo ou um agrupamento, distinto de qualquer outro, com vida própria, interesses especiais e necessidades peculiares.
Nesta razão, o sentido de nação não se anula porque seja esta fracionada esta entre vários Estados, ou porque várias nações se unam para a formação de um Estado. O Estado é uma forma política, adotada por um povo com vontade política, que constitui uma nação, ou por vários povos de nacionalidades distintas, para que se submetam a um poder público soberano, emanado da sua própria vontade, que lhes vem dar unidade política. A nação preexiste sem qualquer espécie de organização legal. E mesmo que, habitualmente, seja utilizada em sinonímia de Estado, em realidade significa a substância humana que o forma, atuando aquele em seu nome e no seu próprio interesse, isto é, pelo seu bem-estar, por sua honra, por sua independência e por sua prosperidade.
“Aion”, “Kairós”e “Kronos” . Aion é a contagem do tempo longo, longuíssimo como o “Baktun” dos Maias. Kairós, um bloco de tempo, uma oportunidade, como, por exemplo, os famosos “anos dourados” no Brasil. Kronos, o tempo medido pelos relógios – segundos, minutos, horas.