quarta-feira, 25 de setembro de 2013

O SER HUMANO FRENTE À TEORIA DA RESTITUIÇÃO

O SER HUMANO FRENTE À TEORIA DA RESTITUIÇÃO                                

  

 
 

1. Introdução

               
               Em 19.08.2013 todos os noticiários, tanto da imprensa escrita quanto digitalizada do mundo inteiro, informaram  a novidade científica de  que os Físicos Roger Penrose  (conceituado membro da Universidade de Oxford) e Vaher Gurzadyan,  armênio e membro da Universidade Estadual de Yerevan,  em parceria de estudos, chegaram à seguinte conclusão :  "Big-Bang" não teria sido apenas um episódio do início do nosso Universo, mas esse episódio foi também o fim de um outro que se transformou no atual, ou seja "seria a  implicação de que o Universo já existia, em outra forma, antes do período de expansão que conhecemos e observamos hoje".
 
           Tal afirmação científica corresponde  à minha afirmação filosófica, sobre a  transformação cíclica do Universo e da vida, conforme coloco no  livro editado em 2012, que abrange uma análise  do início e destinação da vida, sob o enfoque da Filosofia, das Leis  e da Ciência, a que denominei "Teoria da Restituição". Ela adveio através da observação e análise dos dados científicos, notadamente da Teoria das Cordas, em Mecânica Quântica,  e das afirmações das principais correntes filosóficas antigas e modernas, quer  em âmbito  genérico, quer especificamente da "teoria geral  das  obrigações" em confronto com leis  físicas. Cheguei, dessa forma, por raciocínio lógico, a uma conclusão  semelhante à apresentada pelos eminentes Físicos. E, assim, como vocês hão de compreender, não posso conter a minha satisfação, o meu entusiasmo,  tanto  como pessoa humana quanto de estudiosa dos fenômenos  da Vida em sentido amplo, ao verificar  a confirmação das minhas ideias e, ao mesmo tempo, a necessidade de comunicar-lhes essa ocorrência  nesta oportunidade. Mas, para tanto, torno a recordar,  foi necessário penetrar nas conclusões e afirmações  científicas que embasavam todo o procedimento que levei a efeito e que narro  no contexto total do referido livro, para chegar a essa nova teoria, multidisciplinar, que ali apresento e explico. É um volume extenso e com o texto que reproduzo abaixo não  se pode pretender  a compreensão  do seu conteúdo, mas  é suficiente para se fazer a comparação com o fato noticiado - visto por um outro ângulo, que entendo complementar.
 
                  Os  conceituados cientistas não utilizaram o método filosófico. Chegaram a essa conclusão através de análises de  sinais e imagens enviadas pela sonda americana projetada para fazer um "mapeamento   universal da radiação cósmica de fundo - um "eco" do Big Bang gerado quando o Universo tinha menos de 400 mil anos de existência, detectado pelo satélite na forma de micro-ondas. Hoje, o Cosmo tem 13,8 bilhões de anos". E"A Folha de São Paulo  Twitter",  em postagem de 10/08/2013, nos  dá o seguinte resumo das conclusões deles:                    

                "Penrose e Gurzadyan vêm dizendo, desde 2010, que conseguiram detectar pequenas flutuações na radiação cósmica de fundo, na forma de círculos concêntricos.
                        Isso, segundo eles, seria resultado da colisão de buracos negros gigantes numa época que precedeu o Big Bang. Ou seja, seria implicação de que o Universo já existia, em outra forma, antes do período de expansão que conhecemos e observamos hoje." 

              Dessa forma, entendo de todo oportuno, dada a coincidência de conclusões a que  chegamos, colocar em postagem parte do texto em que exponho a minha visão do mesmo  fato, colhida através de raciocínio lógico, a partir  da análise de textos científicos, notadamente das 5 Teorias das Cordas, através da Teoria M que as unifica. De fato há um  ponto no conhecimento em que  tanto a Ciência quanto a Filosofia se encontram para unificar conceitos  nem sempre  apresentados  materialmente e que dependem de um "feeling" de impressões  racionais para se integrarem todas as partes apresentadas pelos diversos  ramos do conhecimento humano. E essa comunhão de dados é que possibilita a  observação final , o que está contido  plenamente na "Teoria Geral dos Sistemas",  apresentada pelo genial cientista  Von Bertalanffy, também "expert" em Filosofia e outros ramos do conhecimento, cuja utilização ofereceu tanto impulso  ao desenvolvimento tecnológico e científico em nossos dias : em resumo, ele demonstra em seu livro de mesmo nome, que  essa divisão nas diversas áreas do conhecimento é uma construção artificial do homem e não condiz com a realidade da Natureza, que é sistemática, sendo que todos os seus fenômenos se apresentam  em uma comunhão de  acontecimentos material e racionalmente percebidos, sistematizados em uma só unidade - há realidades materiais e imateriais agindo sobre os fenômenos naturais. E, segundo ele, ainda, é por isso que uma verdade científica somente pode ser determinada se examinada  por todos os seus ângulos,   isto é, o conjunto formado por observação, experimentação e  elaboração racional sobre as probabilidades  é que nos leva ao conhecimento da completude de um fenômeno. Por isso entendo que todos os estudiosos do mesmo assunto, sob os diversos ângulos, devem unir seus esforços de forma conjugada.
                  Apresento, a seguir, uma cópia das páginas 339 a 351 do livro "TEORIA DA RESTITUIÇÃO - O Direito do Futuro. A nova etapa evolucionaria humana : a Filosofia, as Leis e as Ciências", de minha autoria , ed. Editora Maet, de 2012, às quais acrescentei uma sistematização de itens e  imagens , visando a uma exposição mais adequada ao ambiente Internet.   
 

2.  O ser humano deve  integrar a restituição? 

 
 
                   Tanto faz nos  filiarmos à teoria criacionista, ou evolucionista, chegaremos  à conclusão de que o livre-arbítrio no ser humano lhe imprime apenas uma opção pelo seu destino, ou seja, evoluir ou perecer. O movimento evolutivo é uma lei natural, em todos os  seres  em nossa dimensão, independente de instinto ou vontade. O que não se adapta, perece, como indivíduo ou espécie. Se a nossa opção é por preservação da espécie, devemos participar da manutenção do modelo sutil do qual somos reflexos – é a restituição.

                     No Criacionismo : O que se pode verificar, saindo-se  da valoração teológica dos acontecimentos  chamados de   “glorificação  de Deus” , como Criador de todas as coisas existentes, é a ocorrência de  modificações  no Universo que  interferem  em  sistemas naturais  planetários . Como exemplo, a superfície do Planeta Marte, que aparece atualmente inóspita e desértica,  de acordo com as novas informações do telescópio Hubble, tem resíduos de água que indica haver tido ele,  algum dia  , um ambiente existencial semelhante ao  nosso (dada a verificação da existência de água em estado sólido  em alguns locais, e, líquido, no seu interior, embora em temperaturas  muito baixas). 

                      Teologicamente, o termo “glorificação” nos vem  desde o Antigo Testamento da Bíblia Cristã, nos Salmos de Davi,  19,1-2 , afirmando , em síntese, que eternamente  os céus e o firmamento  anunciam a obra das mãos de Deus. Ora, sendo a matéria perecível, tenderia tudo à destruição, e não haveria uma eternidade  para esse anúncio. Cientificamente, o termo mais aproximado de “glorificação” seria “evolução” e, acrescemos aqui, “sutilização”, que não se confunde com “mudança de estado” como  ocorre com a água, quando vai do  líquido para o sólido. Em Tomás de Aquino também se pode entrever esse  movimento  evolucionário , embora não o denomine expressamente  assim — quando  ele se refere à busca de uma perfeição das coisas criadas à semelhança da perfeição divina ,  observamos  um certo paralelismo à restituição, conforme  a nossa teoria.

                      No evolucionismo :  Darwin, em  sua famosa obra “A Origem das Espécies”, baseado em observações e pesquisas  sobre a fauna existente na Ilha de Galápagos, concluiu sobre  uma origem  humilde para o ser humano, a partir de um hominídeo , evoluindo até a sua forma atual. Nesse ponto, então, contradiz a teoria criacionista, que  entende o seu aparecimento no planeta já com o aspecto atual, a partir de um antepassado  sem parentesco com outros seres inferiores.

                   No evolucionismo, contudo, não há  uma tentativa de explicação sobre o aparecimento de vida no planeta : isto é, procura um entendimento  sobre a existência  dos seres da natureza atual, a partir de antepassados que foram se adaptando às condições naturais, sem indagar, por sua vez, a origem primeira  dos seres iniciais.
 
                   Em ambas as teorias  , o que se depreende é uma tendência  a um equilíbrio permanente em todo o meio ambiente : as espécies ,animais e vegetais, além dos inanimados , existem como vetores de   todo o ecossistema, cada um em sua  função . Por isso, no evolucionismo, os seres terrestres  vão adquirindo ou perdendo habilidades necessárias à sobrevivência, em razão de mutações no meio ambiente planetário, não entrando no detalhe do que ocorre a cada indivíduo após a morte; e, no criacionismo, cuja raiz é filosófica ou teológica, a tendência é  a perenidade  do estado inicial, em outra realidade existencial, com a separação da alma do corpo material, enquanto outras almas vão  se unindo a outros corpos — todo esse movimento seria consequência da  procura de um aperfeiçoamento  assemelhado à perfeição  do Criador (em outras palavras,  uma procura constante da mesma condição   do início  de todas as coisas, além da realidade simplesmente  material, independente de tempo e espaço — em teologia  judaico-cristã, corresponderia a um   paraíso perdido).
 
                No Restitucionismo :  Há uma atividade inicial de criação do Universo em que está a nossa realidade planetária, a partir da qual  se operaram ciclos evolucionários  que poderão ou não se repetir eternamente, dependendo da resposta  operada de  seres de dimensões mais densas à  energia vital procedente de ambientes sutis, atendendo a regras  gerais antecedentes a esses ciclos, ou estabelecidas a partir do ciclo inicial, mas operantes em todos eles (seria uma “Teoria de Tudo” ou “Teoria Geral”). Mesmo que no início houvesse  uma realidade  aparentemente caótica, teria sido natural  o surgimento de padrões de frequência    para a união de energia e matéria , repetidos na formação dos ciclos permanentes de regeneração das realidades  exauridas (Teoria do Caos –  Quadro 7 e Nota 54). 

 

3.  A visão da Origem  Humana no Restitucionismo face às Ciências Modernas


 
 
              A “Teoria da Restituição” não apresenta uma visão anterior à ocorrência da singularidade em nossa dimensão  que  teria dado  o início ao nosso universo, o chamado “Big-Bang”.  Ela apenas reúne conceitos  filosóficos e científicos atuais, do que se imagina ser  uma atividade criadora como início de uma realidade,  sem se indagar, teologicamente, sobre o “Criador” que impulsionou a movimentação de energia existencial da Fonte Originária   para a matéria  com ou sem formas, de qualquer maneira inerte, imprimindo-lhe movimento e vida,  que deve manter um nível de sustentabilidade para durar. Havendo matéria e energia, há movimento .

               Pergunta-se e responde-se : O ser humano, no planeta Terra, deve participar da Restituição? Por quê?
                                         
              Não é somente o livre-arbítrio característico do ser humano que produz energia evolutiva em nosso planeta. Nós não temos essa exclusividade,  até porque ela não depende do livre-arbítrio, característica ou  elemento de aferição de uma superioridade  em relação a terceiras espécies.  É o que nos têm  demonstrado a Arqueologia, a Paleontologia e a Geologia : de acordo com a maioria das teorias aceitas, houve outros fundamentos para  se implementar superioridade , como  as descomunais medidas materiais de  muitos dinossauros e seus contemporâneos nos oceanos do período triássico da idade da Terra, que dominaram a vida nela durante  cerca de  160 milhões de anos, que se iniciou há 250  milhões de anos, ocorrendo sua extinção em massa  há mais ou menos 65,5 milhões de anos —  eles, à época, teriam sido “os donos do mundo”, posição que, atualmente, julgamos também ocupar , tanto tempo depois. E, talvez, tenhamos o seu mesmo destino, incompreensível  à Geologia, à Arqueologia e à Paleontologia  dos novos  seres que, de futuro, nos substituirão, ao examinarem  os restos  de nossa civilização. E, a esse passo, devemos entender que somos também  elos de uma longa cadeia  em busca de  um ser final, o objetivo  de todo o nosso impulso  genético à preservação da Vida, o conhecido “instinto de preservação da espécie” , existente em todos os seres vivos conhecidos. 

              Pode ser até que sejamos, como diz Whitehead (73)  , uma  das poucas entidades que têm , como uma das  formas superiores de vida , como ato  consciente ou inteligente, a preensão   e a  compreensão   de estarem fazendo parte  de uma natureza experimental , com finalidade de obter uma satisfação  capaz de  adicionar-lhe uma evolução  rumo ao mundo ideal, componente  ou não da natureza divina — em uma  visão  filosófica ou teológica. O posicionamento   do filósofo inglês foi no primeiro sentido, tendo criado a teoria denominada Filosofia do Processo (74).   Segundo ele, qualquer forma de  seres inferiores , apesar de não  ter essa compreensão, também faz parte da mesma “experiência natural” e , como tal,  possui a preensão  de todo esse processo , em que  todas as entidades, das mais  superiores às mais inferiores que existem no Universo,  não são isoladas ou independentes, mas estão presentes, em conjunto, em todos os momentos reais, estabelecendo-se um vínculo permanente de interação  entre todas elas ,  nos ciclos de criação-evolução-restituição.
 
              Pode-se contrapor ao que estamos expondo, o argumento de falta de prova científica à teoria da restituição , em ciclos de criação→evolução →restituição e de Co-Criação → evolução → restituição. Essa oposição seria , em concreto, à  ideia  de vários ciclos existenciais : um primeiro ciclo de criação inicial, seguida de  “n” ciclos posteriores  e interdependentes . Mas, acaso existe essa prova em sentido contrário?  A nossa base é filosófica e científica, com alicerces nas teorias científicas  modernas : a novidade dela  é a conjugação  de conceitos de todas elas.
 
              O nosso entendimento criacionista não é  teológico,  mas consoante à  Teoria do Desenho Inteligente, sem discutirmos  o “omnes qui”  (“quem quer que”) portador da  responsabilidade intelectual da atividade de desenhar. A mais  se tem, por outro lado, a aplicação do postulado aristotélico , válido em nosso ambiente existencial,  o que pode não ocorrer em outro, de natureza completamente diversa do nosso, que ainda não conhecemos : “o nada  não pode produzir nada”.  E,  se existimos como entidades individuais, em um universo onde os mesmos   elementos formadores  da matéria visível se encontram distribuídos equitativamente, é de se concluir que houve  um elemento  material comum no início  da expansão universal, por mais ínfima que tenha sido sua densidade e tamanho,  expandido por uma energia que lhe imprimiu o primeiro movimento expansionista , qualquer que fosse sua procedência, necessária  para operar  a  singularidade inicial.        No sentido filosófico do que seja o “nada” , em nosso ambiente universal, entendemos  não estar incluído nem  o conceito de “potência”  enunciada  por Aristóteles, nem o “vir-a-ser”  explicado  por Platão. Em outro sentido, o nada  seria  o “tudo”, em qualquer ambiente  que jamais tivesse tido  sequer a possibilidade de existir . Sendo assim, um ato de criação, que não se confunde com o compreendido na análise teológica,   necessitaria , em nosso universo, de uma possibilidade de “vir-a-ser” ou de tornar-se um “ato”, personalizado ou não. A expansão   desse Universo, com implemento  de formas  inertes e outras vivas que se transformam em outras tantas  ou as substituem, já é objeto de  evolução, conforme a ciência atual aceita (evolucionismo de Darwin). A novidade do Restitucionismo é teorizar sobre o retorno dessa energia (que chamamos de existencial) ao ambiente de onde proveio  , acrescida  de um “plus” energético vivencial (obtido em nosso sistema),  que lhe teria dado o impulso eficiente para sua liberação da matéria e do ambiente denso : há trocas de energia entre sistemas abertos e fechados, estando o nosso planeta incluído entre estes últimos. Essa conclusão decorre, por eliminação, de uma dentre duas hipóteses possíveis para energias contidas em  sistemas :  (a) ou permanece  no interior de um sistema sutil  ou denso , ou (b)   é capaz de sair do seu sistema e  entrar em outro, com a mesma capacidade de sair deste e  retornar ao   de origem.  Descartamos  a hipótese (a)  porque, se  houve a entrada da  energia em um sistema, é porque se  trata de um  sistema fechado, que admite trocas energéticas, embora não  as admita em relação à  matéria. E, se entendermos em contrário,  se idealizarmos um sistema  isolado, também não poderemos admitir a ocorrência do “Big-Bang”,  nem a influência de uma oscilação de membranas ou cordas, como previsto na “Teoria M” , pois, em ambos os casos, parte-se do pressuposto de uma carga energética externa àquela(s) existente(s) originariamente — também não poderíamos imaginar a ocorrência de “entropia” (ver notas 64 e 65)  no interior do Universo porque houve transformações de energias e, naquele estado, toda a existente teria se transformado em calor, que não admite mais nenhuma transformação. 

                  Todas  as teorias citadas  em nosso trabalho têm larga   aceitação  filosófica e científica e nenhuma se opõe à outra, havendo princípios comuns, sendo  perfeitamente válido, até por uma razão de lógica,  reuni-las em uma outra que explique, multidisciplinarmente,  a finalidade de todo esse movimento existencial que  inunda não só o nosso planeta, mas todo o Cosmos.  De qualquer sorte, como já vimos, essa divisão em ramos separados do conhecimento  humano é artificial  e vem de uma época distante, quando ainda não  tínhamos a noção da integração e interação  dos atos e fatos da natureza — esta não admite  várias realidades para um mesmo fato. Convém ressaltar, contudo, que amanhã esses conceitos sobre os quais alicerçamos nosso entendimento podem se demonstrar inoperantes em função de uma “Teoria do Tudo” , pois , atualmente,  todas as posições filosóficas e científicas  envolvendo qualquer elemento transcendente ao nosso entendimento são apenas  teorias, umas mais aceitas e outras menos, mas todas passíveis de  superação , já que não foram ainda provadas. E , dentre  elas, se incluem  a da “Relatividade Geral”, segundo Einstein, a da “Evolução”, segundo Darwin, a do “Big-Bang”, a do “Desenho Inteligente” (ou Criacionismo Moderno), e a “Teoria das Cordas”, incluindo a “Teoria M”.
 
                 A  produção de “emissão de energia → evolução → restituição → emissão de energia etc.”  seria , em uma outra observação, uma descrição do princípio de transformação da energia (em sede de Termodinâmica) — apenas o calor é uma energia que não se transforma, como comprovado cientificamente, em nossa dimensão existencial. Assim, por uma questão de similaridade,  a partir de determinado modelo em uma dimensão sutil, uma centelha sua  lançada ao espaço e  adaptada a cada dimensão por onde atravessa ou se  prende, e  reflete as formas ideais sutis, em geral,  acompanha esse princípio  termodinâmico. Não somente naquelas formas  que a nossa  ciência conhece , mas em muitas outras ainda  não  identificadas, visíveis ou invisíveis por nós (como tem ocorrido no caso dos “extremófilos”), com  a constituição  de DNA, já identificada ou não. E todos, individualmente ou em conjunto, participam , em formas relativas (de composição de matéria e energia), desse movimento  evolutivo, cíclico, de  dimensão em dimensão.
 

 4.  Ciclos Evolutivos e Co-Criação  

                                                
 
 

                  Princípio de  Evolução : parte da energia  da fonte     originária se desloca para o espaço,  com a predeterminação ou  não de adquirir  massa e produzir trabalho, enriquecendo –se com energia  cinética , sofrendo transformações e depois retornando, realimentando-se. Evolução :  parte da Energia  procedente da fonte  permanece  no ambiente em que produziu seu “plus”, produzindo modificações ali e parte retorna  à Fonte Originária,  realimentando-a.

                Daí em diante tudo funciona como um moto perpetuo, com vários ciclos  sucessivos e talvez subciclos  concomitantes. Nos mesmos ambientes ou em outros .
                            
                Voltemos, após esses esclarecimentos,   à análise  esquemática dos Ciclos Evolutivo-Restitutivos.                                          

1º. Ciclo  Evolutivo — Restitutivo Primário :

                 Esgota-se a 1ª.  Restituição quando, por hipótese, o  Universo já se encontra com uma organização que lhe permita a manutenção de leis e forças em harmonia. Fazendo-se um paralelo com o universo da computação gráfica, é como se fosse o caso de um programa de computador auto reprogramável, ao qual bastasse o impulso da colocação do programa inicial para dar início a todo o sistema, no tempo e no espaço, com ou sem  previsão para um fim predeterminado. A partir  dessa estabilidade  de diversas reprogramações, que teriam de ser sempre realimentadas por energias em transformação , tudo passaria a funcionar como um moto perpetuo  cosmológico, com reentradas (restituições) e saídas (distribuição, doação) de energia em relação à fonte reiniciadora, provocando, sempre, o impulso continuativo, com uma  potência muito inferior à do Big-Bang inicial.           
 
 
Demais Ciclos Evolutivos    Restitutivos Secundários    

                    Pela teoria da origem do Universo mais aceita atualmente, ele    seria finito, como um grande sistema  “isolado”, em que não haveria entradas nem saídas, sequer de    energia. Nesse caso, já desde o início , por época do Big-Bang, deveria estar previsto o número de vezes necessárias para que ele atingisse   o seu ponto de perfeição,  o que  indicaria o número  que substituiria a incógnita  “N”  da nossa hipótese colocada no esquema a seguir.  Stephen Hawking,  já citado , consideraria que  ele estaria   composto, ab initio,  para produzir seres como nós, mas , data venia, mesmo se nós apoiássemos  a tese  da finitude  univérsica, agora, não seria  porque  consideraríamos o que existe o produto final de tão grande evento quanto foi o Big-Bang, pois  não condizemos, em nosso planeta, tão  ínfimo em relação ao Cosmos, ao  status de seres ou coisas mais evoluídas, em todos os sentidos. E, além do mais, os adeptos da teoria da finitude  a preveem para daqui a muitos bilhões de anos : ou por  esgotamento de expansão dentro de uma fronteira  já existente, havendo  uma inversão (contração)  ou por esgotamento  das energias não renovadas do sistema isolado do Universo, que transformaria tudo em calor (matéria e energia), ocorrendo o que, na Teoria Geral dos Sistemas se  denomina  “steady-state”.
 
                    Sendo assim, tanto faz haver uma previsão para um final do Universo, por ter alcançado sua finalidade, quanto  a continuidade ad aeternum  da movimentação em espiral , nos numerosos  ciclos Restitutivos  secundários, ou por  esgotamento  do tecido espaço-tempo , no qual se movimenta, ou por haver sido acrescentada uma outra dimensão, ou ter havido sua transposição para outra, ou , ainda, por  superaquecimento em “steady-state”,  a nossa Teoria da Restituição continua a  afirmar haver um movimento de retorno, em qualquer caso, de uma energia inicial, procedente do Big-Bang, sempre acrescida de um “plus” de energia  transformada e cinética, também  obtida pela energia  potencial da matéria inerte colocada em movimento  pela força aliada à massa,  que manteria o ideal de impulso para novas  evoluções. A falta do retorno dessa energia mais o plus é que  desencadearia  a paralisação  do sistema evolutivo existente.              
 
                 Se a Energia Existencial, nas dimensões mais sutis, não é realimentada, enquanto vai perdendo  sua quantidade pela ejeção de centelhas ao espaço, sem entradas  que a recomponham ou acresçam, o que se faz, de acordo com a visão restitucionista,   pela devolução  daquelas com um “plus” de energia evolucionária  (Energia Existencial  somada à Energia  Evolucionária, Quadro 4) , haverá o perecimento do modelo correspondente, que se incorporará a outros,  deixando pouco a pouco  de refletir  a forma ideal — extinguindo-se o modelo, consequentemente se extinguirão os seus reflexos.  Conforme se depreende, essa fonte emissora somente poderia ser , no máximo, um sistema  fechado, porque, se fosse isolado, não poderia  fazer esses lançamentos e, não admitindo trocas, terminaria em “entropia”  , ou, não atendendo às mesmas leis que operam no nosso, seria incompatível com ele, não sendo, pois, a fonte dessa energia e teríamos de imaginar outra — já que nossos cientistas informam ter havido a entrada de uma “energia desconhecida para  provocar o Big-Bang” originário. E, por fim, sem a restituição da Energia à fonte originária, para que ela possa recompor as perdas,  pode haver extinção de espécies inteiras em nosso ambiente denso, especialmente em nosso planeta , ou corpos mais complexos  no ambiente cósmico , porque, se não passamos de seus reflexos, não poderíamos existir sem que previamente existisse um modelo a ser refletido.
 
                   O ser humano, como espécie, se decidir por uma via  que não lhe forneça uma evolução individual completa ou  integrada à espécie e ao ecossistema em que existe (tanto psíquica quanto materialmente), tende  a desaparecer . Talvez não de uma forma profundamente  diferente  em seu aspecto  animal de hoje, mas numa eliminação  de seu componente  emocional, moral e ético, que faz parte da sua definição.

                   Em uma grosseira comparação  do que ocorre  num ambiente interdimensional , pode-se  imaginar o exemplo, em nosso meio ambiente, do  reflexo de zilhões de espelhos paralelos  de nossa imagem material – em relação a essa metáfora, o nosso corpo denso é que  seria o reflexo de um corpo sutil e não o oposto, conforme defendemos para a realidade da restituição.
 

                  Se o original for fraco, não se formará nenhuma imagem refletida, apenas vultos difusos, até que finalmente desapareçam completamente. E poderão restar, então, no meio denso, aparências do que algum dia foram seres humanos, desprovidas elas de seu elemento psíquico, onde se concentra  o “plus” energético necessário à manutenção  de sua identidade  de energia vital,  e a força de impulso para fora do nosso sistema,ou energias remanescentes fora da matéria,  eternamente presas  à dimensão densa, enquanto  todos os outros seres  terão evoluído para formas mais sutis, com níveis existenciais bem mais  agradáveis e harmoniosos.  
_________________ 
(73)  e (74) Alfred North Whitehead : grande filósofo e matemático inglês , nascido em 15 de fevereiro de 1861 e falecido  em 30 de dezembro de 1947. Seu campo de pesquisas foi, notadamente, o da filosofia da ciência, utilizando conceitos  e  fundamentos  transcendentais da matemática. Criou a Filosofia do Processo, que, dentre os principais entendimentos ,possui o  de que  fatores acidentais inseridos em uma equação podem influir no resultado : sejam as mudanças na realidade (passageiras ou permanentes) , psicológicas , físicas ou orgânicas, devem fazer parte  de um estudo em conjunto com ela — pois, ao  iniciarem sua existência, tornam-se eficazes para sua modificação, passando a constituir parte do  todo integral, acrescendo-lhe ou  diminuindo-lhe características. É , embora  naturezas inferiores,  possam não ter a compreensão de estarem interagindo para uma finalidade comum, por não  serem racionais, possuem, contudo,   a sua  “preensão”  . Termo que vem do latim  praehendere, que significa  tomar, pegar; receber; tirar, arrebatar, agarrar; prender...”  .
                                            Acrescemos a esse entendimento  de Whitehead o seguinte : alguém humano pode possuir o que denominamos de “dom”, ou uma inspiração  procedente de  uma memória arquetípica transmitida de seu inconsciente para o seu consciente,  para perceber  o inter-relacionamento de  fatos  e ocorrências incomuns em nossa natureza, sem , contudo, possuir o desenvolvimento intelectual suficiente para  entendê-los  ou  indagar  da  sua origem, natureza ou finalidade , de acordo com os conhecimentos científicos  à nossa disposição ,   mas tem a capacidade de  desenvolver o conhecimento necessário para tanto, através de sua racionalidade, como elemento  factual de sua própria existência. Em seres que denominamos de irracionais, não há  a capacidade de chegar a compreender esse fato, por um impedimento natural de falta de raciocínio lógico conforme o tem  a espécie humana. Como , por exemplo, a necessidade animalesca de alimentar-se vegetarianamente  ou  carnivoramente — ao praticar uma ou outra  opção, um animal não faz as indagações do ser humano sobre  sua conveniência ou necessidade, apenas “sabe” que deve fazê-lo porque tem fome;  ao praticar o ato sexual, não indaga sobre uma finalidade de preservação da espécie e transmissão de seu DNA, ou apenas de seu prazer pessoal, age apenas por  “instinto” , conceito inserido  no ato de “preensão”. Em relação ao todo do plano   universal, , nós, humanos ,ainda temos mais “preensão”  do que “compreensão", e devemos evoluir para  um estágio   de raciocínio moral e ético,  acima de um parâmetro antropocêntrico, para podermos nos comportar, cientificamente, frente às realidades cósmicas, livres de  preconceitos sobre   parâmetros  que adotamos atualmente e não servem para mensurar as realidades ali existentes. Realizado esse exercício racional de  livre-arbítrio, conseguiremos  alargar nossas fronteiras intelectuais, sem o que  permaneceremos  num   estágio  evolucionário mental  equiparável, em relação ao macroambiente integral, à mesma situação dos seres  considerados por nós como inferiores , em nosso ecossistema  terrestre.
 
Consultar também a Nota 68.

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

RUI BARBOSA - ORAÇÃO AOS MOÇOS

RUI BARBOSA : ORAÇÃO AOS MOÇOS

                                                     
 
 
 
1. Sobre a Lei

Uma vez, que Alcibíades discutia com Péricles, em palestra registrada por Xenofonte, acertou de se debater o que seja lei, e quando exista, ou não exista.
 
— Que vem a ser lei? Indaga Alcibíades.
 
— A expressão da vontade do povo, responde Péricles. 

— Mas que é o que determina esse povo? O bem, ou o mal? Replica-lhe o sobrinho. 

— Certo que o bem, mancebo. 

— Mas, sendo uma oligarquia quem mande, isto é, um diminuto número de homens, serão, ainda assim, respeitáveis as leis? 

— Sem dúvida. 

— Mas, se a disposição vier de um tirano? Se ocorrer violência, ou ilegalidade? Se o poderoso coagir o fraco? Cumprirá, todavia, obedecer? 

Péricles hesita; mas acaba admitindo:

— Creio que sim. 

— Mas então, insiste Alcibíades, o tirano, que constrange os cidadãos a lhe acatarem os caprichos, não será, esse sim, o inimigo das leis? 

— Sim; vejo agora que errei em chamar leis às ordens de um tirano, costumado a mandar, sem persuadir. 

— Mas, quando um diminuto número de cidadãos impõe seus arbítrios à multidão, daremos, ou não, a isso o nome de violência? 

— Parece-me a mim, concede Péricles, cada vez mais vacilante, que, em caso tal, é de violência que se trata, não de lei. 

Admitido isso, já Alcibíades triunfa:

— Logo, quando a multidão, governando, obrigar os ricos, sem consenso destes, não será, também, violência, e não lei? 

Péricles não acha que responder; e a própria razão não o acharia. Não é lei a lei, senão quando assenta no consentimento da maioria, já que, exigido o de todos, desiderandum irrealizável, não haveria meio jamais de se chegar a uma lei.

Ora, senhores bacharelandos, pesai bem que vos ides consagrar à lei, num país onde a lei absolutamente não exprime o consentimento da maioria, onde são as minorias, as oligarquias mais acanhadas, mais impopulares e menos respeitáveis, as que põem, e dispõem, as que mandam, e desmandam em tudo; a saber: num país, onde, verdadeiramente, não há lei, não há moral, política ou juridicamente falando. 

Considerai, pois, nas dificuldades, em que se vão enlear os que professam a missão de sustentáculos e auxiliares da lei, seus mestres e executores. 

É verdade que a execução corrige, ou atenua, muitas vezes, a legislação de má nota. Mas, no Brasil, a lei se deslegitima, anula e torna inexistente, não só pela bastardia da origem, senão ainda pelos horrores da aplicação. 

Ora, dizia S. Paulo que boa é a lei, onde se executa legitimamente. Bona est lex, si quis ea legitime utatur. Quereria dizer: Boa é a lei quando executada com retidão. Isto é: boa será em havendo no executor a virtude, que no legislador não havia. Porque só a moderação, a inteireza e a equidade, no aplicar das más leis, as poderiam, em certa medida, escoimar da impureza, dureza e maldade, que encerrarem. Ou, mais lisa e claramente, se bem o entendo, pretenderia significar o apóstolo das gentes que mais vale a lei má, quando inexecutada, ou mal executada (para o bem), que a boa lei sofismada e não observada (contra ele).
                                      
 
 
 


2. Sobre as Leis e a Justiça

Que extraordinário, que imensurável, que, por assim dizer, estupendo e sobre-humano, logo, não será, em tais condições, o papel da justiça! Maior que o da própria legislação. Porque, se dignos são os juízes, como parte suprema, que constituem, no executar das leis, em sendo justas, lhes manterão eles a sua justiça, e, injustas, lhes poderão moderar, se não, até, no seu tanto, corrigir a injustiça. 

De nada aproveitam leis, bem se sabe, não existindo quem as ampare contra os abusos; e o amparo sobre todos essencial é o de uma justiça tão alta no seu poder, quanto na sua missão. “Aí temos as leis”, dizia o Florentino. “Mas quem lhes há de ter mão? Ninguém”.
 
Le leggi son, ma chi pon mano ad esse? Nullo”.
 
Entre nós não seria lícito responder assim tão em absoluto à interrogação do poeta. Na constituição brasileira, a mão que ele não via na sua república e em sua época, a mão sustentadora das leis, aí a temos, hoje, criada, e tão grande, que nada lhe iguala a majestade, nada lhe rivaliza o poder. Entre as leis, é a justiça quem decide, fulminando aquelas, quando com esta colidirem. 



             Soberania tamanha só nas federações de molde norte-americano cabe ao poder judiciário, subordinado aos outros poderes nas demais formas de governo, mas, nesta, superior a todos. 
 

Dessas democracias, pois, o eixo é a justiça, eixo não abstrato, não supositício, não meramente moral, mas de uma realidade profunda, e tão seriamente implantado no mecanismo do regímen, tão praticamente embebido através de todas as suas peças, que, falseando ele ao seu mister, todo o sistema cairá em paralisia, desordem e subversão. Os poderes constitucionais entrarão em conflitos insolúveis, as franquias constitucionais ruirão por terra, e da organização constitucional, do seu caráter, das suas funções, de suas garantias apenas restarão destroços.                   
 
 
Eis o de que nos há de preservar a justiça brasileira, se a deixarem sobreviver, ainda que agredida, oscilante e mal segura, aos outros elementos constitutivos da república, no meio das ruínas, em que mal se conservam ligeiros traços da sua verdade.
 
Ora, senhores, esse poder eminencialmente necessário, vital e salvador, tem os dois braços, nos quais aguenta a lei, em duas instituições: a magistratura e a advocacia, tão velhas como a sociedade humana, mas elevadas ao cem-dobro, na vida constitucional do Brasil, pela estupenda importância, que o novo regímen veio dar à justiça. 

Meus amigos, é para colaborardes em dar existência a essas duas instituições que hoje saís daqui habilitados. Magistrados ou advogados sereis. São duas carreiras quase sagradas, inseparáveis uma da outra, e, tanto uma como a outra, imensas nas dificuldades, responsabilidades e utilidades.

Se cada um de vós meter bem a mão na consciência, certo que tremerá da perspectiva. O tremer próprio é dos que se defrontam com as grandes vocações, e são talhados para as desempenhar. O tremer, mas não o descorçoar. O tremer, mas não o renunciar. O tremer, com o ousar. O tremer, com o empreender. O tremer, com o confiar. Confiai, senhores. Ousai. Reagi. E haveis de ser bem sucedidos. Deus, pátria, e trabalho. Metei no regaço essas três fés, esses três amores, esses três signos santos. E segui, com o coração puro. Não hajais medo a que a sorte vos ludibrie. Mais pode que os seus azares a constância, a coragem e a virtude.
 
Idealismo? Não: experiência da vida. Não há forças, que mais a senhoreiem, do que essas. Experimentai-o, como eu o tenho experimentado. Poderá ser que resigneis certas situações, como eu as tenho resignado. Mas meramente para variar de posto, e, em vos sentindo incapazes de uns, buscar outros, onde vos venha ao encontro o dever, que a Providência vos havia reservado. 

Encarai, jovens colegas meus, nessas duas estradas, que se vos patenteiam. Tomai a que vos indicarem vossos pressentimentos, gostos e explorações, no campo dessas nobres disciplinas, com que lida a ciência das leis e a distribuição da justiça. Abraçai a que vos sentirdes indicada pelo conhecimento de vós mesmos. Mas não primeiro que hajais buscado na experiência de outrem um pouco da que vos é mister, e que ainda não tendes, para eleger a melhor derrota, entre as duas que se oferecem à carta de idoneidade, hoje obtida. 

Pelo que me toca, escassamente avalio até onde, nisso, vos poderia eu ser útil. Muito vi em cinquenta anos. Mas o que constitui a experiência, consiste menos no ver, que no saber observar. Observar com clareza, com desinteresse, com seleção. Observar, deduzindo, induzindo, e generalizando, com pausa, com critério com desconfiança. Observar, apurando, contrasteando, e guardando.

                                                                 


3. Sobre o Juiz

É  à magistratura que vos ides votar?

Elegeis, então, a mais eminente das profissões, a que um homem se pode entregar neste mundo. Essa elevação me impressiona seriamente; de modo que não sei se a comoção me não atalhará o juízo, ou tolherá o discurso. Mas não se dirá que, em boa vontade, fiquei aquém dos meus deveres.
Serão, talvez, meras vulgaridades, tão singelas, quão sabidas, mas ande o senso comum, a moral e o direito, associando-se à experiência, lhe nobilitam os ditames. Vulgaridades, que qualquer outro orador se avantajaria em esmaltar de melhor linguagem, mas que, na ocasião, a mim tocam, e no meu ensoado vernáculo hão de ser ditas. Baste, porém, que se digam com isenção, com firmeza, com lealdade; e assim hão de ser ditas, hoje, desta nobre tribuna.
           Moços, se vos ides medir com o direito e o crime na cadeira de juízes, começai, esquadrinhando as exigências aparentemente menos altas dos vossos cargos, e proponde-vos caprichar nelas com dobrado rigor; porque, para sermos fiéis no muito, o devemos ser no pouco.

Qui fidelis est in minimo, et in majori fidel est; et qui in modico iniquus est, et in majori iniquus est”.
Ponho exemplo, senhores. Nada se leva em menos conta, na judicatura, a uma boa fé de ofício que o vezo de tardança nos despachos e sentenças. Os códigos se cansam debalde em o punir. Mas a geral habitualidade e a conivência geral o entretêm, inocentam e universalizam. Destarte se incrementa e demanda ele em proporções incalculáveis, chegando as causas a contar a idade por lustras, ou décadas, em vez de anos.
Mas justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta. Porque a dilação ilegal nas mãos do julgador contraria o direito escrito das partes, e, assim, as lesa no patrimônio, honra e liberdade. Os juízes tardinheiros são culpados, que a lassidão comum vai tolerando. Mas sua culpa tresdobra com a terrível agravante de que o lesado não tem meio de reagir contra o delinquente poderoso, em cujas mãos jaz a sorte do litígio pendente.
           Não sejais, pois, desses magistrados, nas mãos de quem os autos penam como as almas do purgatório, ou arrastam sonos esquecidos como as preguiças do mato.

Não vos pareçais com esses outros juízes, que, com tabuleta de escrupulosos, imaginam em risco a sua boa fama, se não evitarem o contato dos pleiteantes, recebendo-os com má sombra, em lugar de os ouvir a todos com desprevenção, doçura e serenidade.
           Não imiteis os que, em se lhes oferecendo o mais leve pretexto, a si mesmos põem suspeições rebuscadas, para esquivar responsabilidades, que seria do seu dever arrostar sem quebra de ânimo ou de confiança no prestígio dos seus cargos.

Não sigais os que argumentam com o grave das acusações, para se armarem de suspeita e execração contra os acusados; como se, pelo contrário, quanto mais odiosa a acusação, não houvesse o juiz de se precaver mais contra os acusadores, e menos perder de vista a presunção de inocência, comum a todos os réus enquanto não liquidada a prova e reconhecido o delito.
          Não acompanheis os que, no pretório, ou no júri, se convertem de julgadores em verdugos, torturando o réu com severidades inoportunas, descabidas, ou indecentes; como se todos os acusados não tivessem direito à proteção dos seus juízes, e a lei processual, em todo o mundo civilizado, não houvesse por sagrado o homem, sobre quem recai acusação ainda inverificada.
 
          Não estejais com os que agravam o rigor das leis, para se acreditar com o nome de austeros e ilibados. Porque não há nada menos nobre e aplausível que agenciar uma reputação malignamente obtida em prejuízo da verdadeira inteligência dos textos legais.

Não julgueis por considerações de pessoas, ou pelas do valor das quantias litigadas, negando as somas, que se pleiteiam, em razão da sua grandeza, ou escolhendo, entre as partes na lide, segundo a situação social delas, seu poderio, opulência e conspicuidade. Porque quanto mais armados estão de tais armas os poderosos, mais inclinados é de recear que sejam à extorsão contra os menos ajudados da fortuna; e, por outro lado, quanto maiores são os valores demandados e maior, portanto, a lesão arguida, mais grave iniquidade será negar a reparação, que se demanda.
            Não vos mistureis com os togados, que contraíram a doença de achar sempre razão ao Estado, ao Governo, à Fazenda; por onde os condecora o povo com o título de “fazendeiros”. Essa presunção de terem, de ordinário, razão contra o resto do mundo, nenhuma lei a reconhece à Fazenda, ao Governo, ou ao Estado.

Antes, se admissível fosse aí qualquer presunção, havia de ser em sentido contrário; pois essas entidades são as mais irresponsáveis, as que mais abundam em meios de corromper, as que exercem as perseguições, administrativas, políticas e policiais, as que, demitindo funcionários indemissíveìs, rasgando contratos solenes, consumando lesões de toda a ordem (por não serem os perpetradores de tais atentados os que os pagam), acumulam, continuamente, sobre o tesoiro público terríveis responsabilidades.

 
 ________
 
NOTA : Excerto do livro de Rui Barbosa, "Oração aos Moços"  , com inclusão de subtítulos e  gravuras nossos, com o fim de sistematizar os temas.  

Trata-se de uma carta que tem como tema a ética profissional.
BARBOSA, Rui. Oração aos Moços . São Paulo (SP): Martin  Claret      Ed., 2004

 
"Em 1920, Rui Barbosa fora convidado a paraninfar a turma de Direito da Faculdade do Largo de São Francisco, mas fora impedido de comparecer devido sérios problemas de saúde. O célebre advogado, jornalista e político envia, então, a turma um discurso que redigiu em março de 1.921. No texto, o autor faz um balanço de sua vida, uma síntese de sua maturidade intelectual e discorre sobre o papel do magistrado e a missão do advogado, para que sirva de exemplo para todos que pretendem seguir tal ofício. O discurso é, então, lido pelo professor Reinaldo Porchat na colação de grau da turma.
No ápice de sua vida profissional, ao completar cinquenta anos de carreira jurídica, a intenção de Rui Barbosa nessa obra é transmitir suas experiências positivas e negativas, ideias, reflexões e conselhos àqueles que estavam iniciando a prática jurídica."